NA BRIGA DA ORIGEM

27 de Março de 2012 21h03

A questão da pigmentação da pele tem dado e continua dando o que falar.

Heckel Januário

 

Em sua formação e firmação, a elite brasileira, escravocrata por excelência, tinha a braveza de achar inclusive já com as provas da miscigenação em curso a cor branca como superiora.

Nesse processo, de definir o brasileiro como povo, essa suposta superioridade branca sempre esteve ocupando largo espaço, e era defendida por gente do calibre de um Nina Rodrigues (este mesmo do conhecido IML - Instituto Médico Legal, de Salvador, nomeado em sua homenagem), médico, intelectual, legista, antropólogo-autor  de vários livros e grande contribuinte da medicina brasileira–, um sustentador que o ser humano de cor preta pertencia a raça inferior. Tal tese, sobretudo por defendida por intelectualidade de alto nível, seria, à luz dos dias atuais, considerada tendenciosa, ou no mínimo, sem nexo.

Na briga da origem, a mistura do imigrante europeu, negro africano e do índio daqui saiu-se vencedora, mas os descendentes com predominância de pele negra, sem darem –como assim se comportaram os de tez branca– bolas pro resultado miscigenado, empreenderam, principalmente em tempos hodiernos, vitoriosos e justos movimentos na conquista da cidadania, sobressaindo-se, com efeito, em variados lócus da sociedade. Foi desta maneira, e inovando, e conquistando gregos, troianos e adjacentes por todo o país, que ser “negão” passou a um estilo de vida, em especial entre a moçada aqui da Bahia, com destaque entre outros, na aparência, para as famosas tranças rastafári, e, na música, para a imponência e harmonia do som percussivo.

“Os pesquisadores afirmam que os genes da cor da pele e dos cabelos são muito poucos e desprezíveis na herança genética. Assim, o leigo toma esses efeitos visíveis como indicativo de raça, mas estão enganados”. Este entre aspas faz parte de “Os ‘negros’ brasileiros são africanos?”, artigo de Mario Eugenio Saturno, Tecnologista Sênior do INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), publicado em 24 de fevereiro no jornal Diário de Ilhéus que li, guardei e resolvi trazê-lo à reflexão. Percebeu bem? É sugestivo e diz respeito, o texto completo, a duas pesquisas sobre herança genética: uma da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e outra da USP de Ribeirão Preto em parceria com Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia.

Impactantes? A meu ver, sim. Sem entrar em outros detalhes, a resposta dada à análise do “genoma de 934 pessoas, observando um conjunto de 40 variantes de DNA” é que a ascendência europeia na população brasileira nunca se mostrou inferior a 60% (indo aos 80%) e que a menor contribuição é do indígena, só passando dos 10% na região Norte do país. Ao panorama o autor não hesitou na conclusão: “Isso mostra que muita gente que se diz negra, querendo remeter ancestralidade à África, não passam de europeus com pele escura”.

Também a pesquisa desbanca uma “crença histórica” de que o maior percentual (70%) dos escravos vinha de Angola - e somente 10% da parte ocidental da África–, ao constatar que esta região africana, sobremaneira a Nigéria, pode ter dado uma contribuição “... até quatro vezes maior”. A segunda pesquisa, que constou da “verificação de 180 índios da etnia pataxó, distribuídos em seis aldeias do sul da Bahia, próximo a Porto Seguro”, o resultado foi igualmente (o mesmo realizado com outras tribos do Brasil) surpreendente ao assegurar, apesar do secular contato com os europeus, que “cerca de 80% dos pataxós têm DNA tipicamente indígena” e ainda, “que seus parentes mais próximos são as tribos do Brasil Central, como os craôs e os caiapós”. Pra quem não acredita na existência de índio com tamanha pureza...

Fica aí então com o caro leitor do século XXI, refletir e chegar a uma conclusão.

                                                                                                                                                                                                                            Heckel Januário

 

 

 

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